23 de março de 2005

PQP!

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Dianne Reeves mostrou ontem, dia 22 de Março, no Centro Cultural de Belém, por que razão é considerada uma das dignas sucessores das grandes vozes do jazz do passado.

Acompanhada por Peter Martin (piano), Reuben Rogers (contrabaixo) e pelo baterista Gregory Hutchinson, Dianne Reeves conseguiu surpreender mesmo aqueles que já a tinham visto e ouvido no Estoril Jazz no final dos anos 90.

E como ela cresceu desde então e ganhou ainda mais domínio sobre a sua voz, tornando-se igualmente uma exímia entertainer, que soube captar o interesse do público e levá-lo ao rubro.

Em termos de estilo é notório que Reeves pretende navegar utilizando os mapas traçados pioneiramente por Betty Carter, cantora que ela aponta como a sua grande influência, mais do que Sarah, Ella ou Billie. O seu scat singing tem a marca da diferença, ainda assim, e está cada vez melhor, embora ainda tenha margem para melhorar. Nessa altura Reeves será imbatível, acreditamos.

Reeves mostrou-se à vontade nos tempos lentos (como provou na notável interpretação de "Skylark") e nos tempos mais dinâmicos, conseguindo alguns momentos de absoluta perfeição nos seus scats. E que bem souberam temas como "In a Sentimental Mood" e "Prelude to a Kiss" (a fazer lembrar a interpretação de Peggy Lee). Só tivemos pena de Reeves não ter cantado temas como "River", "Ain't Nobody's Business" (onde é absolutamente brilhante em estúdio) ou Suzanne. Mas, vá lá, em compensação cantou o interessante e funky "Mista".

Vale a pena referir que quanto a nós uma das grandes diferenças de Reeves para outras cantoras é que ela consegue pegar nos temas clássicos, nos standards, e dar-lhes uma leitura actual. Ouviram o que ela fez a "That's All"? Pois é... esta é a prova de que não é preciso cremar e enterrar o songbook americano e que depois de décadas e décadas volvidas sobre a criação dos seus principais temas ainda é possível ser criativo na sua interpretação. Outra diferença é o seu scat singing, o que a distingue claramente das suas "colegas" do smooth jazz, bem menos interessantes. Em Reeves há ritmo, há alma, há o pulso do jazz, há África, há swing!

Pianista e baterista estiveram ao nível desta grande voz do jazz. Nota menos positiva para o contrabaixista, penalizado por um som mal equalizado, que o tornava praticamente inaudível.

A organização está de parabéns por este evento que encheu por completo o CCB, sendo de realçar o facto de ter conseguido captar o patrocínio da VW para o concerto (será que os responsáveis da VW gostaram do facto de Reeves ter "pedido" um Mercedes?). Esta é a prova de que o jazz não tem de ser eternamente subsidiado pelo Estado. O CCB cheio é a prova de que há público e de que havendo público existe retorno do investimento para as empresas patrocinadoras. Agora só falta realizar um estudo sério sobre o público do jazz e partir à procura das marcas certas para o perfil do público. Este é um desafio que nenhum produtor de jazz pode ignorar.

Em nossa opinião neste momento o jazz vocal feminino tem duas vozes que são realmente de nível superior: Dianne Reeves e Dee Dee Bridgewater.

De resto, nada do que se ouviu ontem se voltará a ouvir noutro concerto porque tudo foi, como Reeves referiu, fruto do momento, da inspiração, da energia vinda do público e da sala.

Assim é o jazz!


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